Ecos de Fátima
"... particularmente significativa e iluminante é a página do Evangelho em que S. João visualiza o rosto concreto desta misericórdia no encontro da mulher adúltera com Cristo. Esta cena é uma pérola evangélica de incomparável beleza, de comovente ternura e profundidade doutrinal que Santo Agostinho sintetiza numa frase lapidar: “Relicti sunt duo: misera et misericordia”!
Ficaram só os dois: a miséria humana e a misericórdia!
A pobre pecadora aparece em toda a miséria da sua culpa: não só perdeu publicamente a honra, mas está prestes a perder a vida. Jesus manifesta-se como a misericórdia incarnada e pronuncia um juízo de absolvição:
“Nem eu te condeno. Vai e não voltes a pecar”.
Tu vales mais, infinitamente mais, do que o teu pecado.
A dramaticidade da cena é dada pelo confronto entre o abismo da miséria humana e o abismo ainda maior do Amor que Deus tem por nós.
Estamos diante das dimensões inenarráveis e indizíveis deste Amor, que S. Ambrósio comenta de modo admirável: “Não tenhas medo de que o Pai não te acolha; na realidade, Ele não se alegra com que os vivos se percam. Tu tremes por tê-lo ofendido; mas Ele restitui-te a tua beleza”. De facto, Jesus restituiu à adúltera a beleza perdida: salvou-a como mulher, na sua dignidade de pessoa, na sua humanidade, na sua feminilidade, na verdade do seu amor, na sua relação a Deus. Ela é, de ora em diante, um texto vivo e eloquente da misericórdia de Deus.
Eis pois a beleza do Amor misericordioso que nela se espelha: o Amor que perdoa, cura as feridas, resgata, enche de graça e ternura, cumula de dons, rejuvenesce, defende com justiça os oprimidos, arranca ao poder do pecado e da morte, relança no caminho de uma vida nova. É aquele Amor entranhado do Pai que diz a cada um: Tu vales mais, infinitamente mais, do que o teu pecado. Tem confiança! Não há qualquer situação irremediavelmente perdida."