Jesus cura um cego de nascença (Jo 9). Há tempos Anselmo Borges escrevia que todos, isto é, o ser humano, somos prematuros, segundo a teoria da neotenia. A teoria diz, “no essencial, que o Homem é um prematuro - para fazer o que faz, precisaria de permanecer no ventre materno mais um ano, mas isso não é possível; assim, nasce no termo de 9 meses, em vez de passados 20 -, tendo, portanto, de receber por cultura aquilo que a natureza lhe não deu” (aqui).
Penso que somos também, todos, cegos de nascença. Viver é aprender a ver. No evangelho deste domingo, diz-se que Jesus deu a vista ao cego – a um sábado. Com tantos dias da semana, tinha de trabalhar ao sábado, este provocador. Noutras passagens, diz-se que Jesus é a luz do mundo. A vista, ainda que dada ou por isso mesmo, pertence-nos. Ele nunca disse: “Eu sou a visão do mundo”. A visão é nossa. Mas não vemos sem a luz. Já com uma visão novinha, o ex-cego afirma: “Eu creio Senhor”. E não: “Eu vejo, Senhor”. Os efeitos colaterais da nova visão estão para além do ver. Temos de aprender a ver com outros órgãos que não os olhos. E os olhos servem para muito mais do que ver. Para crer, por exemplo.